Não que sinta orgulho daquilo que faço, tão menos admiração do modo pelo qual escolhi viver.
Também não posso dizer propriamente a palavra ‘’escolha’’, se não tive sequer qualquer outra opção que pudesse mudar o desespero que sentia por estar sozinha e desamparada num mundo que exige mais do que podemos oferecer.
Não havia outra saída, se agora não se tratava apenas de meus próprios problemas quase sempre sem nenhuma solução. Existia outra vida, que surgira inesperadamente dentro de um corpo incapaz de gerar e fornecer abrigo, para mais tarde carinho e proteção.
Engravidar não podia ser previsto, se sempre busquei me precaver com todos os desconhecidos que me procuravam ao longo das madrugadas extensas e frias, e nada tinham a me proporcionar, a não ser a quantia cobrada no término de mais um novo programa, que simplesmente já havia se tornado habitual.
Sophia não foi premeditada, tão menos desejada, mas foi a única capaz de mudar minha vida por completo, fazendo com que sentisse novamente esperança de lutar pelo melhor.
Quando surgiram os primeiros sintomas de uma gravidez que me causara tanto surpresa quanto decepção, pensei na primeira hipótese que qualquer mulher na mesma situação optaria sem hesitar. Aborto consensual.
Francamente, não entendo porque fraquejei, mas me faltou coragem para chegar ao final. A idéia de matar uma vida que crescia me assustava tanto quanto o fato de permiti-la crescer.
Entrar em trabalho de parto em sete meses de espera não foi tão simples quanto pensei. Sophia nascera prematura, tão pequena e indefesa que quase cabia na palma de minhas mãos.
Quando a vi pela primeira vez esqueci todo medo que sentia por talvez não a querer. Mas a quis com todo meu coração, com tudo que no mundo fosse pleno e feliz.
Sorri, chorei num estado de frenesi que não me permitia acalmar por um segundo sequer. Mas a alegria de tê-la em meus braços me fez esquecer o mundo em si, por segundos de admiração que tornaram o momento uma raridade sem definição.
Do instante que a concebi até os anos que passaram rapidamente devo relatar que foi um período de escolhas e aprendizagem que me transformaram por inteira, modificando uma vida para viver em função de outra, que havia também agora se tornado minha.
Sete anos se passara, e foram os anos que mais me orgulho de toda a minha a existência contida. Ela se tornara a razão de todo amor que pulsava dentro de mim.
Ainda tão pequena, mas de uma inteligência incomparável. Era capaz de compreender qualquer ensinamento que lhe fosse passado.
Não perdi nenhum de seus movimentos, estive ao seu lado para cada respiração ocorrida.
Até mesmo quando adoeci continuei por perto, pois logo estaria novamente bem. Outro engano e outra surpresa, quando estendi o braço para que me tirassem o sangue esperando então um resultado para qualquer doença comum.
Esperei no corredor por horas inteiras, angustiada e cansada por ainda estar ali. Quando me trouxeram o resultado de um exame que me desamparara por completo, fazendo-me perder qualquer reação que pudesse acontecer.
Minha pequena e doce Sophia, o que será de você?
-HIV positivo.
Meus olhos que não acreditavam no que liam, e choravam desesperadamente a espera de um engano, que fosse um sonho talvez.


0 comentários: